A FELICIDADE DE ELISA
Elisa! Hoje ao me
sentar para escrever, veio à memória alguns assuntos: uns banais, outros de
cunho sério, como de ficção, contestação, religioso. Apesar de fluir
naturalmente havia outra coisa mexendo com minha cabeça e afastando os meus
pensamentos de concatenar as ideias em torno dos assuntos. Não saía da minha
mente e também, curiosamente, não invadia a minha privacidade. Eu sentia-me
satisfeito e feliz, pensando como se fosse um despertador me despertando para o
que devia escrever. Então abrir a crônica “A Felicidade” escrita em outubro de
2011, voltei a ler e reler com a alegria de criança brincando, com o brinquedo
que o pai não quer, com o entusiasmo de estudante fazendo uma leitura que gosta
e passando as linhas do Word pausadamente cheguei ao final do texto satisfeito.
Então, fui buscar o que mexia com a minha cabeça e que não saía da minha mente.
Um comentário do referido texto de uma leitora, que hoje a considero amiga, e
que suas palavras me ensinaram a gostar dela com uma profunda afeição, que somente
nas grandes amizades se consegue. É uma amizade com duas pessoas, mas somente
uma pessoa existe. Explico qualquer relação só existe, quando existe o outro
que a constitui. O paradoxo é em função de que ela sabe da minha existência,
mas não sabe que cativou uma amizade e conquistou um admirador. Deixa-a saber.
Gosto de todos que se interagem comigo, através do meu blog, Muitos são
assíduos leitores de minhas crônicas e tem esse tipo especial de pessoas que
conquistam literalmente a nossa amizade e que invertem valores, começam nos
enviando simples comentários e terminam sendo os protagonistas de nossos
trabalhos. Elisa é uma delas. Seu comentário à minha crônica que transcrevo na
integra é uma obra prima, que demonstra toda sua sensibilidade, seu talento e
sua visão sobre a felicidade do parkinsoniano. “O Parkinson tem o poder de nos
fazer entender sobre muitas coisas que, antes, envolvidos nas ondas de uma vida
superativa, não percebíamos! A felicidade é uma delas. Vivendo em câmera lenta
ou parada no acostamento da vida por algum motivo parkinsoniano, podemos
observar a vida nos seus mínimos detalhes, por exemplo, viagens para a praia
nos fins de semanas e feriados; ficar perdido e suado no meio do trânsito;
dormir até mais tarde e sempre ter vontade de ficar um pouco mais na cama;
chegar cansado do trabalho; ir à feira e encher a geladeira de frutas; dar uma
corrida no quarteirão; brincar com os filhos; correr com os cachorros dentro de
casa; carregar os netos; cozinhar para a família no Natal; e está com a agenda
sempre cheia de convites para eventos sociais, etc. Cada um pode usar a
imaginação e ver o que muitos não viam e que o Parkinson veio nos mostrar.
"Eu era feliz e não sabia..."! Em “A FELICIDADE”! Elisa, você
complementa e transcende a minha crônica, “eu era feliz e não sabia” e me
remete aos tempos de criança, jogando botão na calçada ou trocando figurinhas
sem a compulsão de satisfação de ganhar, muito mais movido pelo prazer de
brincar de levantar a taça, e o orgulho de vencer sem a ilusão de grandeza. Eu
faço minhas crônicas com um único objetivo de ajudar, com minha experiência, os
parkinsonianos o que a vida, empiricamente, me ensinou, e evidentemente uma das
ferramentas mais eficiente da comunicação atual é esse espaço fantástico que é a
web. E minha mais pretensiosa intenção é chegar à família dos colegas de
Parkinson, uma vez que é no entorno da família que podemos criar e desenvolver
a afetividade, sentir o aconchego, os conselhos de como será envelhecer com a
família, sentir o tempo passar e se ter a consciência dos anos que nos restam.
É a família que nos oferece a proximidade das relações humanas. É também, uma
grande assembleia de conflitos, onde gerações distintas choram, riem, cantam, e
festejam, anualmente, o Natal, onde o jantar é preparado por Elisa. Assembleia
de erros e de reconciliação. O sentimento de ser e ter uma família proporciona
ao doente desenvolver referências que lhes confere participar na vida social da
comunidade. É a família o endereço certo para uma convivência familiar
harmoniosa e afetuosa que o doente de Parkinson necessita para desenvolver sua
autoestima para enfrentar os problemas de ordem física e emocional, decorrentes
dos sintomas da doença. E gente como você me eleva a uma nova felicidade, a um
novo objetivo, a novas ideias, a pensar em escrever de novo sobre o tema que é
fascinante. Pelos poetas e escritores muita coisa já foi dita. O que falta?
Pois não se esgota nunca, mesmo que ainda falte muita coisa, você contribuiu
com a sua felicidade. Como toda crônica tem um título e usando sua frase:
“Vivendo em câmera lenta ou parada no acostamento da vida por algum motivo
parkinsoniano, podemos observar a vida nos seus mínimos detalhes” eu vou dar um
título: “A Felicidade de Elisa”. Pretendo, com isso, proporcionar a você a
felicidade que senti, quando recebi seu comentário. Essa minha atitude, também,
serve para outros comentários seus, e de outros doentes de Parkinson, que
acolhe minhas palavras, ou mesmo daqueles que rejeitam, pois esses, também, me
proporcionam outro grau de satisfação. Seu comentário sobre a crônica “A
Felicidade” foi maior que a satisfação de quando a escrevi. As coisas nossas,
não sei por que, somente tem um caráter de satisfação, quando socializadas
entre nós mesmos, depois então sentimos o sabor de compartilhar com os outros,
mas antes passa por esse crivo seletivo do nosso universo. É um sentimento
digno de mencionar Rubem Alves, quando ao escrever ouvindo música afirma:
“enquanto escrevo ouço música, mas sua beleza se transforma em alegria se um
amigo ouvisse comigo”. Assim, quando escrevo, acontece o prazer de escrever aos
amigos de Parkinson, mas minha alegria cresce ao receber o devolutivo, como vem
acontecendo com você. Saber, ter a certeza de que alguém está lendo e
analisando minhas crônicas e fazendo críticas, construtivas ou não, é alegria
multiplicada por dois. Uma quando escrevo e outra no devolutivo. Ruim é não ser
lido, nem criticado por ninguém. É ter uma bola e não ter o parceiro para
jogar. Obrigado! É assim que crescemos como amigos e construímos as diferenças.
Em cada comentário, que recebo, vem contido sentimento de parkinsonianos e
encontro valores que engrandecem e justificam minhas crônicas. Minha alegria
começa quando escrevo e não tem fim, pois fico sempre numa expectativa de um
novo devolutivo. E sempre que o devolutivo acontece, ocorre a conjugação de
força, acontece a comunhão da amizade, a solidariedade e, sobretudo a prática
da democracia em sua maior plenitude. Quem pratica esse prazer desfruta das
virtudes do pensar e escutar, esperar e agir, prazer e alegria, ir e voltar.
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